Caros tertulianos,
Desculpem-me desde já se vos parecer que estou a fazer campanha pois não é isso que pretendo (apesar de não esconder que vou votar não no próximo domingo).
Este é apenas um desabafo de cientista que tem visto e ouvido a ciência a ser altropelada durante este debate e ajustada à conveniência de cada um. Hoje de manhã ouvi na TSF uma cientista (vulgo a Clara Pinto Correia) a dizer que a ciência não pode de forma alguma determinar quando começa a vida humana. Ora isto é puro engano. Cientificamente não há qualquer discussão. A vida humana, como a de qualquer ser vivo, começa no ovo e desenvolve-se num contínuo até à morte. Está vivo (isso é perfeitamente claro cientificamente pois as células dividem-se, os orgãos formam-se e organizam-se, o coração bate) e é da espécie humana, logo é vida humana, isso é incontestável.
O que é legítimo discutir filosficamente/eticamente é se toda a vida humana é pessoa humana, ou seja, se podemos definir (e com que critérios) que ser pessoa humana implica consciência ou capacidade de sofrimento ou o simples facto jurídico de se ter nascido.
Outra coisa que podemos discutir é se do ponto de vista ético, aquilo que uma gravidez não desejada implica na vida de uma mulher tem ou não um valor equivalente ou superior ao da protecção daquela vida.
Podemos ainda ser pragmáticos e achar que uma vez que os abortos se praticam à mesma (e logo aquelas vidas são perdidas à mesma) se não se justificará então fazê-lo de uma forma em que não ameace também a da mulher.
Mas o que não podemos fazer (e que eu como cientista estou FARTA de ouvir por aí) é dizer que não se sabe se é vida humana.
Eu, pessoalmente, acho que a vida dos nossos filhos não nos pertence. Acho que temos toda a legitimidade para decidir de acordo com a nossa liberdade individual como viver a nossa sexualidade. Mas também acho que a nossa liberdade termina onde começa a do outro e esse feto, embrião como lhe queriam chamar não é pertença minha é outro ser humano. E por isso acho que só é legítimo interomper essa vida se a da mulher estiver em causa (porque aí o valor ético dos dois lados da balança é equivalente e nesse caso depende obviamente da consciência individual).
Acho que esta não é uma questão de moral sexual, nem de moral religiosa, mas só de protecção da vida humana (a mesma que é advogada nas cartas dos direitos do homem e dos direitos da criança).
É claro que também me chateia os fanáticos do não usarem argumentos emotivos e religiosos. Mas ultimamente ver a ciência distorcida para se moldar aos argumentos do sim também me parece igualmente falacioso.
Votem sim ou votem não, mas não digam que não é vida humana. Porque na verdade se não fosse não ouviamos tantas vezes eu sou contra o aborto, mas a favor da despenalização. Se na verdade não fosse vida humana, não haveria qualquer problema nisto tudo. A verdade é que é e isso põe-nos face a um dilema ético que cada um saberá equacionar de acordo com a sua consciência. Só não gosto quando trocam as voltas ao problema para ser mais fácil dizer que sim.
Desculpem se me empolguei (tenho tendência para isso) e mais uma vez afirmo que acho legítimas as duas posições mas queria apenas esclarecer o que é que cientificamente estava em jogo.
inté e viva a democracia!